“Vaticanum” é mais um romance de José
Rodrigues dos Santos: o 16º (Gradiva, 1.ª edição de outubro de 2016). Assume
assunto histórico, mas de teor contemporâneo. O argumento tem por base as
palavras de Jesus Cristo: “Ninguém pode servir a dois Senhores: ou não gosta de
um deles e estima o outro, ou há de ser leal a um deles e desprezar o outro.
Não podeis servir a Deus e ao dinheiro” (Mat 6, 24). Tem CI capítulos, Prólogo
e Nota Final.
O tema deste romance são os escândalos
financeiros do Banco do Vaticano (IOR) e outros com ele relacionados, como o
Ambrosiano: lavagem de dinheiro sujo e aplicações financeiras em atividades
contrárias aos princípios da ética católica. As informações sobre a mafia e
valores transferidos, diz o autor, são verdadeiros. O discurso é de leitura
fácil e as unidades sequenciais são encadeadas. A trama dramática, quase
trágica, é aliviada com alguns momentos narrativos e descritivos portadores de
suavidade, elevação ou deleite. A caracterização do cardeal Barboni é cómica,
roçando o satírico. Abundam expressões de calão italiano.
O protagonista é a personagem
Tomás de Noronha: historiador, investigador, criptanalista.
Este romance serve para colocar
diante dos leitores a “porcaria” que infesta o Vaticano. Desta vez, o acento
incide só sobre assuntos financeiros, desmascarando personalidades reais. Há
Judas no Vaticano. Os truques de enredo assentam basicamente em enigmas que
Tomás de Noronha se encarrega de descodificar. O tom enigmático está presente
em toda a narrativa.
Tudo começa pelos alicerces do
Vaticano, tendo por meta a descoberta das ossadas de São Pedro. Termina com o
encontro dramático entre Tomás de Noronha e o Papa em suplício.
Tomás de Noronha é convidado para as investigações
arqueológicas nas catacumbas do Vaticano: encontro das ossadas de Pedro.
Depois, foi envolvido nos acontecimentos de roubo de documentos do Vaticano e
rapto do Papa. Os enigmas começam com o nome de Tomás pronunciado ao contrário
(Samot ) pelo Papa. Depois, veem as profecias catastróficas de S. Malaquias, S.
Pio X e Fátima, relacionadas com o papado, sendo este papa apontado como o
último, surgindo a catástrofe final.
São aduzidas muitas peripécias
que vão entretendo o leitor, relacionadas com as investigações, com as
audiências com o Papa e outros Cardeais. Nas primeiras investigações nos
subterrâneos do Vaticano, Tomás é acompanhado pela namorada Maria Flor (até ao
capítulo XVII), não lhe sendo permitido participar na reunião com o Papa (capítulo
VIII). Nos capítulos que se seguem, Tomás Noronha é posto a par das
preocupações do Papa. No capítulo XVI, é-lhe apresentada, para as novas
investigações, a auditora das contas de Santa Sé (COSEA: Comissão para a
Organização da (E)strutura) Económica e Administrativa), Catharine Rauch. Tudo se desenvolve a partir do
conhecimento que se toma do assalto por um grupo jiadista. A acção principal
passa-se no período de um dia, terminando com a cena de situações dramáticas de
Tomás de Noronha que, não compreendido nem apoiado, se lança, de acordo com a
decifragem dos enigmas, na descoberta do Papa sob a cripta da Basílica de S.
Pedro. As palavras pronunciadas pelo Papa em cativeiro (“Pedro foi o primeiro
papa e que eu não seja o último”; “Que monsenhor Dardozzi e todos rezem por mim
e pela humanidade. O amor de Cristo será para sempre o nosso troféu”, capítulo
L, pág. 244) funcionaram como um verdadeiro enigma que Tomás foi decifrando, investigação após investigação,
e, à luz disso, chegou ao local
do sequestro. O rapto do Papa, que o levaria à degolação transmitida em direto
pela internet, começou mas não se consumou, coroando assim a heroicidade de
Tomás de Noronha.
No fim de tudo, quem sai
denunciado é o Cardial Angelo Barboni, Secretário de Estado do Vaticano, que
colabora em todo o esquema de rapto. É o Judas, traidor. O mau cheiro que é
registado pelo romancista logo nos primeiros capítulos funciona como indício da
porcaria em que a Santa Sé se encontra embrulhada. O primeiro a cheirar mal foi
Barboni. Este comportamento do banco do Vaticano cheira muito mal. No entanto,
o romancista não denigre a imagem da Santa Sé, procurando até desculpá-la com a
intervenção da maçonaria e da mafia, através de banqueiros e políticos que se
infiltraram. O que fez o banco da Vaticano, infelizmente, é comum. Mas não se
limpa.
O Papa Francisco sai de toda esta
teia, que envergonha a Igreja, honrado, elevado, dignificado, sendo mesmo
caracterizado como um bom representante de Pedro e de Cristo, revelando um
coração bondoso, misericordioso e compassivo, mesmo no meio da situação de
extremo sofrimento a que o levou o rapto. O mesmo acontece com Bento XVI, que é
dignificado, e reconhecendo-se impotente para regenerar a Cúria Romana, renunciou.
Professora : Antónia Cunha
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